O silogismo, base do pensamento dialético e de toda a filosofia ocidental – greco-romana – constitui o cerne de um sistema de pensamento dominante. Esse sistema, de sínteses provenientes de confrontação de oposições, como se vê, não é incólume a mascaramentos, induções, ou mesmo ironia da linguagem – senão seria legítimo afirmar que um tomate é, de fato, melhor que a felicidade eterna – que, em última análise, conduzem essa filosofia à adoção de padrões conceituais-morais totalizadores e inibidores da livre expressão individual. É, portanto, sobre a negação dessa trágica forma de pensamento e de seus desdobramentos que Nietzsche conduz sua negação do pensamento ocidental.
A questão que envolve o juízo niilista debate-se com a “ingenuidade moral”[1] das “certezas imediatas” do pensamento europeu, em particular o alemão, predicada no século XIX e que culmina na forma de “idéias modernas” tomadas como crença pelo homem e como mecanismo de conformação intelectual e moral do indivíduo em “animal-de-rebanho”. Esse totalitarismo nivelador da verdade “moderna” compreende e atenua toda a “vontade de potência”, vetor da liberdade individual, supostamente tida como a capacidade de que:
... se pudessem reconduzir todas as funções orgânicas a essa vontade de potência e nela também se encontrasse a solução da geração e nutrição – isto é um problema - , com isso se teria adquirido o direito de determinar toda força eficiente univocamente como: vontade de potência. O mundo visto de dentro, o mundo determinado e designado por seu ‘caráter inteligível’ – seria justamente ‘vontade de potência’, e nada além disso. (NIETZSCHE. 200:311. grifos do autor).
‘Eu sou a moral mesma, e nada além disto é moral!’ – aliás, com o auxílio de uma religião que se fazia a vontade dos mais sublimes apetites de animal-de-rebanho, e os adulava, chegou o ponto em que, mesmo nas instituições políticas e sociais, encontramos uma expressão cada vez mais visível dessa moral: o movimento democrático é o herdeiro do cristão. (NIETZSCHE. 2000:322. grifos do autor).
Contrário a isso, a expressão da nobreza individual, em Nietzsche, encontra-se no posicionamento de uma filosofia avessa à “degeneração geral do homem”, afirmativa da potência do livre-pensar em si, em oposição à “escravidão” moral do “rebanho” que se funda em um utilitarismo afeito a uma visão cética e, mesmo, pessimista do mundo.
A liberdade se dá, nessa perspectiva, na superação da (in) verdade absoluta que postula uma pretensa legalização – institucionalização – da natureza humana, seja através de suas revoluções, seja por meio de seu sistema ótimo e final da democracia cristã. Dessa forma, a felicidade eterna, a liberdade pela “vontade de potência”, está na satisfação dessa fome com esse tomate moderno e em sua excreção do pensamento individual.
São Paulo, 12 de novembro de 2009
[1] Todas as palavras e expressões inseridas entre aspas foram retiradas do texto: NIETZSCHE, F. Para Além do Bem e do Mal: prelúdio de uma filosofia do porvir. In. Os Pensadores: Nietzsche. São Paulo: Nova Cultural, 2000. p. 301-336, passin.